Atualmente as universidades brasileiras passam por um intenso processo de mercantilização, que leva nesta pauta, de imediato, à intensificação e precarização do trabalho docente. Dessa forma, a Universidade está sendo transformada em instituição tutelada pelo capital na concepção do Estado mínimo, para que os recursos privados se apoderem do fundo público sob a nefasta ideologia do mercado.
Com as transformações do mundo do trabalho determinadas pelas mudanças contemporâneas do modo de produção capitalista, impõem-se mudanças objetivas e subjetivas nas relações do trabalho docente. No cenário de mudanças estruturais no modo de produção capitalista, segmentos de trabalhadores que não produzem diretamente a mais-valia são considerados trabalho improdutivo. Nessa categoria, estão os professores universitários, frutos da dinâmica da precarização, relacionado com a intensificação do trabalho docente, simultaneamente ao achatamento e perdas salariais, de captura da subjetividade do trabalhador e da retirada de direitos.
A estrutura da reprodução ampliada do capital e a situação de classe aparentemente diversa como os trabalhadores que realizam o trabalho produtivo e os que realizam o trabalho improdutivo os colocam em uma mesma condição: ambos precisam vender sua força de trabalho para viver, ambos estão submetidos à mesma lógica de exploração do trabalho, tanto em termos objetivos, quanto em termos subjetivos.
Criada as condições objetivas para o aprofundamento da nova hegemonia do capital na universidade pública, percebe-se uma grande aderência dos docentes a tal projeto. Neste cenário, campeia o individualismo e produtivismo despolitizador. Este produtivismo, não problematiza as relações e condições de trabalho, no âmbito da instituição universitária, e descontextualiza a produção científica do cenário político em que ela se dá. Dessa forma, ocorre uma feudalização e compartimentalização, dissociando de interesses de classe ou coletivos.
Vale destacar que, os docentes de ensino superior constituem um segmento que exerce especialmente o trabalho intelectual, independente de sua condição de classe. Tal segmento, por sua vez, muitas vezes não percebe que sua atividade vem sendo sobrecarregada paulatinamente por um projeto expropriador da mais valia. Essas “soluções” reformistas tendem chocar-se com um dos elementos da crise da educação, a separação entre o trabalho manual/intelectual, entre a teoria e prática. Dessa forma, isso se deve também a tradição imposta pela classe dominante que geralmente atribui um sentido de inferioridade ao trabalho manual, confrontando-se do ponto de vista do status com os segmentos que executam este tipo de trabalho. Isso muitas vezes tende a manter uma barreira político-ideológica e cultural na base do movimento docente, que dificulta alianças, articulações e ações integradas com os segmentos do movimento sindical associados ao trabalho manual.
Diante da realidade apontada, as relações do mercado com a Universidade pública se estreitam cada vez mais, verifica-se inúmeros casos da mercantilização de direitos sociais, a exemplo do PNE governista que destinará verbas publicas para as instituições de ensino superior privadas e da aprovação da EBSERH nos Hospitais Universitários. Dessa maneira, cresce a influencia da mercantilização no controle dos rumos da aprovação de projetos de pesquisas e consequentemente na produção científica. Os setores que não atendam diretamente as suas demandas imediatas tendem a ser marginalizados e pormenorizados, quando não extintos. São criados, assim, verdadeiros feudos dentro das Universidades.
A materialização da mercantilização é identificada em um ambiente laboral/profissional marcado por competitividade e pressões pelo desempenho docente, quase que unicamente quantitativo e o cumprimento de metas (gerenciais), geralmente valorizando a atividade de pesquisa frente à de ensino, valendo uma nova máxima “cão que não Lattes, não morde”. Isto, aliado à compressão salarial, à ampliação das exigências de produção e produtividade no campo da pós-graduação e pesquisa, ao produtivismo acadêmico, assédio moral e sexual, atividades de risco e violência no trabalho, perda ou burocratização para obtenção de direitos como insalubridade e Dedicação Exclusiva (DE), entre outros, tem intensificado a precarização do trabalho docente e consequentemente contribuído para desvalorização e adoecimento da categoria.
Na Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), uma das quatro UEBAs, temos a informação oficial de 12 (doze) docentes afastados por licença médica em 2012 e 17 (dezessete) em 2013 (Dados potencialmente subnotificados). Esses dados demonstram um aumento no número de licenças na ordem de 41,7%, um aumento significativo de um ano para outro, evidenciando uma tendência ao adoecimento da categoria dentro desse sistema produtivista e meritocrático perverso.
A perversidade do projeto neoliberal para as universidades brasileiras tem conseguido impor aos professores a quimera de que se trabalharem seguindo os critérios, parâmetros e jornadas de trabalho que o capitalismo estabelece, poderão aumentar seus ganhos e projetar-se profissionalmente de maneira mais efetiva e atingir o “devido reconhecimento”. Ao absorver esta lógica, os docentes abrem mão de sua família, da sua humanidade, da qualidade de vida, da criação coletiva do conhecimento, e da responsabilidade pela sua disseminação para o conjunto da sociedade. O comprometimento da saúde física e mental são as principais consequências, além do embrutecimento das relações pessoais.
Dessa forma, as repercussões para a saúde física e mental do docente sobre essa realidade do trabalho destacam-se: aumento de consumo de álcool, drogas e tabaco – provocado doenças crônicas, principalmente cardiovasculares e respiratórias; depressão – abuso de ansiolíticos, hipnóticos e neurolépticos – suicídios; Síndrome de Burnout – exaustão mental, emocional, fadiga e depressão. Assedio moral – um processo de violência psicológica extremado contra o trabalhador.
Dentre as patologias que acometem a saúde dos docentes, a mais prevalente é a síndrome de Burnout que é caracterizada pela evolução lenta, com piora progressiva e severa; e por passar despercebida, no início, devido á negação de que algo de errado está acontecendo nas relações de trabalho. Contribui, também, para o surgimento dessa síndrome a desvalorização da profissão docente, a falta de autonomia e de participação nas definições das políticas de ensino; a inadequação salarial; a falta de oportunidades de promoções; o isolamento social e a baixa solidariedade; o baixo envolvimento associativo sindical; desinteresse em resolver as precárias e inadequadas condições físicas e matérias de trabalho.
Torna-se imperativo que as patologias advindas das transformações do trabalho docente sejam mais bem elucidadas e discutidas entre os docentes, como o desenvolvimento de um trabalho humanizado como prevenção de fatores estressores causadores de doenças, sob a pena de perderem profissionais valiosos. Dessa forma, o reconhecimento do docente como um trabalhador e, portanto, como um indivíduo submetido á grande máquina da exploração mundial capitalista, permitirá a reação a esta lógica político-econômica dominante.
No campo político, é preciso esclarecer a sociedade quanto ao caráter nefasto do processo em curso e organizar a luta necessária para reverter o quadro que se apresenta. Assim, a luta em defesa da saúde dos trabalhadores e por crescente melhoria nas condições de trabalho dos docentes deve sempre está pautada no cotidiano do movimento sindical e percebida como uma conquista que beneficia a toda uma sociedade.
Pauta de Reivindicações:
1 – Criar ou reativar o GT Saúde do Trabalhador em cada base sindical (espaço coletivo de discussão e denúncia);
2 – Denunciar a intensificação do trabalho docente, nos novos parâmetros de exploração do trabalho (sobrecarga da jornada de trabalho, mérito acadêmico por produção científica, outros);
3 – Desconstruir a cultura da “monetização do risco” no ambiente de trabalho e ter como meta a não exposição ao risco.
ADUSC