Representantes dos docentes, técnico-administrativos, estudantes, e reitores de universidades públicas criticaram, em audiência pública realizada na quinta-feira (26) na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, os sucessivos cortes orçamentários nas instituições de ensino superior (IES) públicas e, em especial, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), o que, segundo eles, têm comprometido o funcionamento das IES públicas desde 2014, quando o governo federal passou a restringir os repasses às instituições.
Eblin Farage, presidente do ANDES-SN, afirmou que os cortes de verbas atingem diretamente o tripé ensino, pesquisa e extensão, no corte de bolsas de iniciação científica e no fim dos projetos de extensão. Eblin explicou que os ataques às universidades vêm desde a década de 90, com projetos de contrarreforma do Estado apontando para a privatização e mercantilização da educação. Confira aqui o vídeo da intervenção.
“Os cortes na área da Educação pública superior, nos últimos três anos, ultrapassaram R$ 3 bilhões deixando a iniciativa privada de fora, demonstrando que o projeto de Educação que os governos defendem é um modelo que intensifica as parcerias público-privadas, subordinando a produção do conhecimento das universidades ao interesse exclusivo do mercado”, disse. Para ela, as recentes imposições de regras para professor voluntário e a cobrança de cursos de pós-graduação lato sensu são mais uma forma de mercantilizar e precarizar a educação.
“Nós, do ANDES-SN, somos radicalmente contrários a isso, pois entendemos que a educação pública é um direito e conquista da população e não existe no mundo exemplo de nação que construiu a sua autonomia que não fosse com a defesa da educação 100% pública, gratuita e de qualidade e socialmente referenciada, e que produza conhecimento a partir dos interesses da sociedade”. A presidente do ANDES-SN citou a importância das emendas parlamentares destinadas ao aumento de verbas das universidades, mas que, para ela, são insuficientes. “Política pública não pode ser balcão de negócios”, criticou.
Reinaldo Centoducatte, reitor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), contou que desde 2014 há uma queda no orçamento destinado as instituições, e que o orçamento deste ano é menor que o de 2013. O reitor apresentou dados que mostram uma redução de 86% nos investimentos (sem contar salários e custeio) previstos no orçamento do ano que vem, em comparação com o orçamento de 2017, para as instituições federais. Para ele, é preciso modificar a legislação que trata da questão da arrecadação. “Hoje a arrecadação da universidade entra no orçamento global e os limites são nivelados para o orçamento da universidade. Como o contingenciamento, a universidade pode até captar recursos, mas não pode utilizá-los. As universidades precisam brigar dentro do próprio sistema”, ressaltou.
Marcos Cordeiro, estudante e vice-presidente do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Ufes, contou da realidade da sua universidade, que possui 25 mil estudantes. Destes, 22% são beneficiários do Plano Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes). “O perfil do estudante que recebe bolsa em sua maioria é composto por mais de 60% mulheres, e mais de 60% destes estudantes são negros, pardos e indígenas. Cortes nas bolsas afetam não só os estudantes, como todo o Estado”. O estudante relatou que a situação é precária também nos restaurantes universitários e na infraestrutura da instituição.
Uerj
A situação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) também foi debatida em audiência. Para os palestrantes, a Uerj foi a primeira universidade a implantar cotas e abrir vagas para cursos noturnos e é referência em todo o país no que diz respeito ao ensino, pesquisa e extensão e, portanto, não poderia estar passando por essa situação de abandono.
Rodrigo de Azevedo dos Reis, tesoureiro da Associação dos Docentes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Asduerj-Seção Sindical do ANDES-SN), criticou os duros ataques feitos a Uerj nos últimos anos e o argumento de diferentes governos de que a instituição seria onerosa ao Estado. “De 2008 a 2016 ocorreu um aumento considerável nos gastos em segurança pública, em R$ 9 bilhões, que é uma política ineficaz. Na área da Educação, em 2008, se gastou mais em educação do que nos últimos três anos, em valores não corrigidos pela inflação. E quando falamos em dívida pública do estado, de 2010 a 2015, ela quase que dobrou, está em R$ 108 bilhões”, afirmou. “A Uerj, em 2015, só representou 2,07% do Orçamento do estado, o que está longe de ser um vilão. O problema do Rio de Janeiro é a falta de receita”, completou. Reis contou que no ano passado mais de 500 terceirizados da limpeza foram demitidos da Uerj, sem aviso-prévio, e sem receber os sete meses de salários atrasados.
Ana Carola, vice-presidente da Asduerj-SSind., falou da urgência em se denunciar a situação da Uerj e propor soluções. “O que nos aguarda para os próximos 30 anos? É importante ter um financiamento garantido para a universidade se planejar”, disse. Os docentes da Uerj estão em greve, mais uma vez, desde o dia 3 de outubro, em decorrência dos salários atrasados. O 13° salário de 2016 não foi pago até o momento e há pendências nas bolsas de pesquisas de mestrandos e doutorandos. A situação já havia motivado uma paralisação em agosto.
Para Regina de Fátima de Sousa, do Sindicato dos Trabalhadores das Universidades Públicas Estaduais do Estado do Rio de Janeiro (Sintuperj), a situação no estado fluminense é “caótica”. “Estamos passando por um período que nunca imaginávamos passar. Sem condições de nos locomover, de chegar à universidade. Muitos sofrendo com os cortes de luz e água em nossas casas, com bancos nos cobrando. É uma situação humilhante”, lamentou . Os técnico-administrativos da Uerj estão em greve há nove meses. Regina ainda citou a situação do Centro Universitário Estadual da Zona Oeste (Uezo) que, segundo ela, sempre foi negligenciada, com números de cotas restritos, com a falta de um restaurante universitário e até hoje sem sede própria.
Professores e dirigentes da instituição cobraram, do governo estadual fluminense, o repasse dos chamados duodécimos do orçamento – que corresponde às doze parcelas mensais que o governo destina para os órgãos públicos que não têm renda própria -, para um planejamento eficiente das instituições.
Ao final da audiência, diversos parlamentares de oposição, sindicatos e comunidade acadêmica e representantes das reitorias da Uerj e Ufes reivindicaram a revogação da EC 95, mais repasses as IES e, ainda, a auditoria da dívida pública brasileira, que garantia mais recursos às universidades, entre outras medidas.
Confira aqui o vídeo da intervenção de Eblin Farage.
Com informações da Agência Câmara Notícias